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A característica essencial para uma marca de carros crescer ou desaparecer

Os apaixonados por carros se recordam de muitos fabricantes que lançaram modelos de sucesso estrondoso, mas logo depois desapareceram. Outras tiveram vida longa, muito prestígio e altas vendas, para entrar em declínio após mudanças no mercado e/ou perfil do consumidor.

Fabricantes que criaram modelos carismáticos e de sucesso – mas que descuidaram da característica central deste artigo – deixam bastante saudade e uma legião de fãs, mesmo depois de décadas de sua extinção. Outras perdem sua relevância aos poucos e morrem sem notadas.

Por fim, existe uma terceira categoria de fabricantes que acumulam longo histórico de desrespeito a esta característica, sobrevivem aos trancos e barrancos, e se (ou quando) abandonam os showrooms, os consumidores entusiastas gritam “já vai tarde!”.

Na quase totalidade dos casos, as empresas que desrespeitam esta característica perdem relevância para outras que a colocam como prioridade. O tema central deste artigo gira em torno desta única qualidade que cria fabricantes de veículos líderes de mercado e garante o sucesso a longo prazo – e a extinção daqueles que a ignoram.

Leia o texto até o final e descubra qual é.

CRIAÇÃO DE VALOR PARA A MARCA

O fabricante de veículos que prioriza esta característica e a mantenha por muito tempo certamente verá crescimento nas vendas, maior valorização e liquidez de seus modelos no mercado de seminovos e, por consequência, poderá cobrar preços cada vez mais altos em seus automóveis e utilitários zero quilômetro. Após um breve histórico de boa reputação, os consumidores buscarão avidamente seus veículos e a rentabilidade do negócio segue alta, acompanhando as margens de lucro.

No aspecto corporativo, o desejo dos consumidores faz o valor de mercado da empresa subir, pois os motoristas ficam felizes em pagar um prêmio para possuir um veículo desta marca. O feliz proprietário também se alegra na facilidade de mantê-lo e, quando não o quiser mais, vendê-lo por um bom preço e encontra um comprador com facilidade.

Na esfera corporativa, a empresa que preza por esta característica também sente o impacto positivo duradouro. As consultorias especializadas na indústria automobilística, como a norte-americana J.D. Power, sempre posiciona estas marcas no topo dos rankings das mais desejadas. Nas bolsas de valores, o valor de mercado destas empresas cresce de maneira contínua e as ações possuem boa liquidez, como os veículos novos e usados desta marca.

Os gearheads mais exaltados, por sua vez, tecem críticas a estas marcas e modelos com frequência, devido à grande quantidade em circulação, à falta de criatividade dos fabricantes, simplicidade mecânica e/ou construtiva, menor quantidade de equipamentos em relação aos concorrentes e razões emocionais das mais variadas.

Ao mesmo tempo em que exaltam outros modelos mais atraentes, exclusivos, avançados tecnologicamente, prazerosos ao dirigir e equipados. Entretanto, sempre recorrem aos mesmos best-sellers, quando a racionalidade se impõe ou aquele parente ou amigo “que não quer ter dor de cabeça com carro” pede ajuda para escolher. No final das contas, o valor agregado à marca por causa desta qualidade prevalece.

ASCENSÃO E QUEDA

Desde o início da indústria automobilística, mais notadamente a partir da produção de automóveis em massa, a quantidade de fabricantes que surgiram, despontaram, declinaram e sumiram pode ser contada aos milhares, ao passo que marcas centenárias continuam entre as mais vendidas e desejadas de modo perene. O que elas fazem para se manter no topo por décadas? Quais são?

Para detalhar com mais clareza, os fabricantes serão separados em cinco grupos:

  1. Fabricantes tradicionais que se mantém entre os líderes e referências de mercado;
  2. Fabricantes tradicionais que já estiveram entre os principais, mas perderam relevância e viraram coadjuvantes;
  3. Fabricantes tradicionais que tiveram grande proeminência, mas desapareceram ou foram vendidos a outros grupos;
  4. Fabricantes jovens ou que entraram há pouco tempo em um mercado já consolidado, priorizando a característica-chave e foram alçadas a líderes ou construíram boa reputação em seus segmentos;
  5. Fabricantes recentes recém-entrantes em um mercado consolidado, sem observância da qualidade tema do artigo, as quais tiveram “voo de galinha” e perderam rapidamente a relevância ou encerraram as atividades.

GRUPO 1

compra de carros entusiasta gearhead subaru outback frente

Dentre alguns dos mais famosos casos do primeiro grupo, pode-se citar Mercedes-Benz, Ford, Chevrolet, General Motors e Jeep e Volkswagen. Sua fundação ocorreu no surgimento da indústria automobilística local e/ou mundial, na qual assumiram a liderança rapidamente em um mercado jovem e composto de centenas de pequenos fabricantes.

A observância da característica essencial ao longo de todas as transformações e mudanças nos mercados local e global, de modo consistente durante décadas as mantém no topo. Mesmo com a chegada de novos fabricantes em diversos períodos, seus produtos mantém a resiliência e competitividade em vendas.

GRUPO 2

carros franceses inovação tecnologia citroën ds

Outros fabricantes tradicionais tiveram grande protagonismo no passado, liderando vendas ou lançando novas tendências e tecnologia. Porém, hoje atuam como coadjuvantes devido à inobservância da característica essencial das líderes. Bons exemplos desse grupo são Peugeot, Citroën, Chrysler, Fiat, Lancia, Alfa Romeo, Opel, Vauxhall, smart, Volvo e Mitsubishi, para mencionar os principais.

Apesar da sua fundação ter ocorrido sob as mesmas circunstâncias das empresas do grupo 1, estas marcas não observaram a característica essencial e perderam sua fatia de mercado para as novas entrantes, ou newcomers, e foram rebaixadas para coadjuvantes – ou underdogs, como dizem alguns entusiastas.

GRUPO 3

puma gtb 4100 1980
PUMA GTB S2 4100. PREÇO EM JANEIRO/1980 – Cr$ 600.981,00. PREÇO EM NOVEMBRO/2018 – R$ 236.923,77.

Em situação ainda mais grave, outras marcas clássicas sucumbiram à concorrência pela inobservância da tal qualidade: as britânicas Austin, Morris, Rover e outras marcas do antigo grupo British Leyland desapareceram ou foram absorvidas por outros conglomerados. Dentre as norte-americanas, a menção vai para Studebaker, Kaiser, AMC, Mercury, Saturn, Oldsmobile, Pontiac e Hummer. De outras nacionalidades, as japonesas Datsun e Scion, a australiana Holden, as brasileiras Gurgel e Puma e as alemãs Auto Union e NSU.

Repare que todas elas tiveram participação relevante nos mercados nos quais atuaram, seja por volume de vendas, inovações tecnológicas, alto desempenho ou engajamento do público. Por não priorizarem este aspecto fundamental para a longevidade de uma marca de automóveis, elas desapareceram.

Algumas delas deixaram um fã clube fervoroso, ansioso por seu retorno. Geram numerosas notícias mesmo décadas depois de fechar as portas. Por sua vez, outras se limitam a citações em tópicos curtos de livros de história do automóvel, e mesmo os motoristas mais experientes, os quais já tinham carteira quando estavam em atividade, não se recordam delas. Ou pior, as lembranças não agradam e por vezes são contadas em histórias jocosas, ao estilo Jeremy Clarkson em seus programas sobre o Reliant Robin.

GRUPO 4

toyota camry sleeper salão do automóvel

De caso pensado, este último grupo de marcas foi deixado para o final. Ele consiste de empresas fundadas após a década de 1950 e cresceram em seus países de origem, em um primeiro momento. Após os gestores decidirem expandir as operações para outros mercados, já maduros, assumiram o desafio de conquistar os corações e mentes de motoristas que já tinham suas preferências, de modo lento e consistente.

Outros fabricantes entraram nesse grupo por meio de uma mudança radical em sua política de desenvolvimento dos produtos, priorizando a característica fundamental nos novos produtos como meio de ganhar mercado dos concorrentes menos competitivos. Os diretores e engenheiros sabem que este é o único meio possível para e permanecer por lá para sempre.

Sete exemplos de marcas que fizeram isso com maestria são a Toyota (e sua irmã premium Lexus), BMW, Audi, Honda/Acura, Nissan/Infinity, Mazda, Hyundai e Kia.

GRUPO 5

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Lifan X60. A empresa teve um início promissor e encerrou suas operações no Brasil em 2019

Da mesma forma que as empresas do grupo 1 iniciam sua operação em mercados jovens, crescem em conjunto com as vendas e, ao final do processo de amadurecimento, se tornam grandes players e lá se mantém. As empresas do grupo 2 conquistam pequenas fatias dos consumidores e se tornam coadjuvantes, enquanto as do terceiro segmento fecham suas portas.

Para as novas entrantes, as empresas do grupo 4 acessam mercados maduros e logo ascendem às primeiras posições em vendas, o equivalentes dos grupos 2 e 3 entre as newcomers compõem o grupo 5: empresas com pouco tempo de operação naquele mercado e amargam baixas vendas ou o fim da operação após alguns anos.

No início dos anos 90, a importação de veículos trouxe uma onda de novas marcas a entrar no mercado brasileiro, antes dominados pelas quatro grandes (Volkswagen, GM, Fiat e Ford) e por pequenas fabricantes brasileiras, as quais produziam de modo artesanal ou em pequenos volumes.

Este momento do mercado foi descrito de maneira bastante pessoal por este autor na série de 6 artigos Memórias automotivas da minha infância, na qual a entrada destes novos fabricantes são descritas em detalhes.

A partir deste período, dezenas de novos fabricantes francesas, japonesas, norte-americanas, coreanas, alemãs e de todas as partes do mundo. Destas novas entrantes, algumas se enquadraram no grupo 4, com destaque para Hyundai, Renault, Toyota e Honda, no caso do mercado brasileiro no final do século passado.

No grupo 5 entram fabricantes tradicionais em outros mercados, como Renault, Peugeot, Citroën, Chrysler, Mazda ou Alfa Romeo, assim como marcas jovens como Kia, JAC Motors, Lifan e Chery, as quais chegaram com grandes promessas e campanhas de marketing milionárias. Algumas tiveram bom volume de vendas durante algum tempo, mas a inobservância da característica fundamental as rebaixou ao Grupo 5, de figurantes ou constam somente nas páginas de revistas antigas. Outros concorrentes subiram ao Grupo 4 por observar a característica-chave.

Agora que todos os grupos de fabricantes foram descritos, chegou a hora de saber qual é a característica fundamental que faz uma empresa ser alçada ao topo e nunca mais sair de lá, ao mesmo tempo que leva outra à queda ou à extinção. Chegou a hora de a conhecê-la, e o leitor mais atento já a descobriu.

A CARACTERÍSTICA ESSENCIAL É…

QUALIDADE

Assegurar padrões de qualidade superiores à concorrência durante toda a existência da empresa, na maioria dos modelos lançados, é a característica essencial para garantir a perenidade de um fabricante de automóveis. Na verdade, de qualquer produto.

Importante ressaltar que a confiabilidade mecânica e baixo índice de falhas estão incluídas no alto padrão de qualidade.

Outro item importante na percepção de qualidade está no pós-venda com bom atendimento e pronta solução de problemas, pois constrói a confiança do consumidor na marca. As marcas premium, as quais vendem modelos com preços de seis ou até sete dígitos, precisam consolidar a percepção de qualidade da marca neste aspecto muito importante.

Ao observarmos os fabricantes dos grupos 1 e 4, pode-se notar claramente a prioridade na qualidade construtiva e confiabilidade mecânica durante a maior parte de suas histórias. Em alguns períodos de suas histórias, elas negligenciaram os padrões de qualidade e perderam vendas em alguns segmentos ou de alguns produtos malsucedidos. Uma vez restauradas a qualidade e confiabilidade, a liderança e boa imagem do consumidor mantêm a marca nas preferências dos motoristas.

Nos grupos 2, 3 e 5, pode-se encontrar diversas marcas que mantiveram bons padrões de qualidade durante boa parte de suas histórias, e seu declínio ocorreu a partir do momento em que descuidaram da qualidade e confiabilidade mecânica.

Algumas marcas possuem modelos com altos padrões de qualidade e confiabilidade mecânica, ao mesmo tempo no qual outros “colegas de showroom” não os têm, e a marca possui imagem intermediária, e sua sobrevivência se deve aos modelos que possuem esta característica, como a Fiat e seus famosos Uno Mille e Strada, ao mesmo tempo no qual o Marea é percebido pelo público como seu exato oposto. E ambos os modelos possuem suas próprias imagens, de modo independente de seu fabricante.

Sugiro ao leitor voltar ao início do texto e reler rapidamente, substituindo as palavras “característica”, “característica essencial”, “característica fundamental” e “característica-chave” por “qualidade” e compreender melhor sua importância.

OUTRAS CARACTERÍSTICAS NÃO IMPORTAM?

Uma pergunta frequente sobre a predominância da manutenção dos padrões de qualidade é: não existem outras mais importantes? Quais são?

Inovação tecnológica

Modelos tecnologicamente avançados e inovadores não sobrevivem a altos níveis de falhas ou manutenção cara e difícil. Estes modelos costumam ser admirados por entusiastas e membros de fã-clubes, ao mesmo tempo em que são rejeitados pelos reparadores e público amplo.

Marcas e modelos inovadores podem ganhar títulos de “carro do ano” de publicações internacionais, receber elogios da imprensa especializada, ao mesmo tempo em que são fracasso de mercado e alvo de memes nos grupos de humor automotivo. Adjetivos como “bomba”, “tia velha” e “resto de rico” costumam apelidar modelos inovadores, mas com alto índice de falhas.

Baixo custo de aquisição e manutenção

Carros baratos de comprar e manter podem vender bem, mas sua carreira será curta sem qualidade construtiva e robustez mecânica. Fatalmente, terminarão com fama de “bombas”, “PT sem bater” e sofrerão alta desvalorização e rejeição. Baixo preço sem confiabilidade atrai o comprador apenas uma vez, porque dificilmente ele volta.

Design atraente

Os modelos “bonitinhos mas ordinários” também podem granjear boas vendas em um primeiro momento, especialmente se o preço for acessível. Todavia, se o bom padrão de qualidade não estiver presente, o veículo bonito e barato viverá um voo de galinha se não for bom.

Pós-venda ruim

Um carro pode ser definido como de boa qualidade, se tiver construção caprichada, confiabilidade mecânica e pós-venda eficiente. Diversos fabricantes são vistos como de baixa qualidade somente por causa do mau atendimento no pós-venda e falta de suporte do fabricante para os consumidores e profissionais do mercado automotivo.

Novamente, o bom atendimento no pós-venda representa parte fundamental da percepção de qualidade da marca.

CONDIÇÃO NECESSÁRIA

Os motoristas possuem expectativas e desejos dos mais variados no momento de comprar um veículo, de qualquer tipo. Diversas pesquisas realizadas com compradores de veículos, ao longo de décadas, constataram que a qualidade superior constitui quase uma unanimidade, desde o comprador de um veículo de vinte anos de uso até um sedã de luxo que custa na casa dos milhões de reais.

Os consumidores, em sua grande maioria, abrem mão de desempenho, design bonito, alta tecnologia e até consumo de combustível. No final, a condição necessária para um fabricante se manter no topo por tempo indeterminado é a qualidade superior e confiabilidade mecânica, observada por todos os líderes de mercado. Qualidade é a característica essencial para a liderança do mercado e conquista dos corações e mentes dos consumidores.

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