O que a Volkswagen precisa fazer para sobreviver à crise e voltar a ser líder
Do início dos anos 60 até 2002, a Volkswagen foi líder absoluta do mercado, chegando a ter mais de 80% do mercado em meados dos anos 70. Com a chegada de novas marcas e o avanço de qualidade da concorrência, a montadora alemã foi paulatinamente perdendo participação de mercado até perder a liderança para a Fiat. Hoje disputa com esta e a General Motors pela liderança, mas não tem obtido sucesso.
Até alguns anos atrás, a Volkswagen tinha fama de qualidade superior, produtos robustos e confiáveis, robustez e performance superior. O velho bloco a ar do Fusca e da Kombi ainda é utilizado para diversas aplicações, inclusive fora da indústria automobilística. O motor AP, referência nos anos 80 e 90, até hoje é o preferido dos aficionados por preparações de alto desempenho, nos quais as mudanças mais radicais chegam a mais de 500 cavalos.
Nos dias atuais, os modernos TSI acoplados à transmissões de dupla embreagem (DSG) também empolgam e fazem jus à tradição da marca em equipar seus veículos com excelentes propulsores. A tecnologia embarcada também agrada a todos. Assistente de baliza, alerta de mudança de faixa, turbo com injeção direta e centrais multimídia diferenciadas estão incluídas em veículos que estão acima da média do mercado. No mercado de usados, os modelos são bem procurados e possuem baixa desvalorização. Mesmo com tantas qualidades, o que está acontecendo que a fábrica de Wolfsburg não retoma a liderança? Vamos elencar alguns pontos críticos:
1. Índice de roubos alto, levando a prêmios de seguro estratosféricos – o principal fator de atratividade para os bandidos reside no compartilhamento de peças e disponibilidade de veículos. Como as peças e motores da VW são comuns a quase toda a linha e há milhões de veículos da marca nas ruas do Brasil, seus produtos são interessantes para os criminosos, resultando em preços de seguros muito altos, chegando a mais de 20% em carros como Parati e Golf. A sua principal rival, a Fiat, padece do mesmo problema. Recentemente, a montadora tem investido em novas tecnologias para reverter o quadro, mas não tem obtido muito sucesso, especialmente nos modelos mais antigos. Mesmo a linha de importados, a qual não divide componentes, onera muito seus donos que querem segurá-los.
2. O acabamento é muito espartano – os veículos da Volkswagen nunca tiveram fama de ter bom acabamento, apesar de a montagem ter evoluído nos últimos modelos. Seus concorrentes entregam cores, texturas e padrões mais bonitos aos olhos do consumidor, especialmente nos segmentos de entrada e compactos. A marca utiliza muito plástico duro e ruídos são uma reclamação recorrente após certo tempo de uso em modelos como Gol, Fox e Voyage. Este problema não relatado na linha de importados, como Golf, Jetta, Passat e Tiguan, os quais entregam ótimo padrão de qualidade.
3. Design muito parecido em toda a linha – a qualidade de construção e os motores e tecnologia são largamente elogiados pela imprensa especializada e pelos consumidores. Porém, os consumidores do segmentos superiores reclamam que o design é muito sóbrio e “sem sal”, além de ser muito semelhante em toda a linha. Ter linhas parecidas entre o Fox e o Passat desagrada os compradores do modelo mais caro, pois a diferenciação é essencial na categoria de luxo. Investir em visuais diferenciados e esportivos traria novos clientes em todas as faixas de preço.
4. Preço – a marca se aproveita da fama de entregar qualidade superior para cobrar valores significativamente mais altos do que a concorrência. Nem todo mundo aceita pagar. Até a abertura das importações em 1990, havia um gap grande de qualidade entre a VW e as demais montadoras, mas a evolução destas reduziu essa vantagem competitiva, e algumas das novas marcas entregavam até mais. Entretanto, o hábito de pedir mais persiste, desestimulando grande parte dos compradores. Uma política de preços mais condizente com a nova realidade impulsionaria as vendas.
5. Pacotes de opcionais caros – este item é um prolongamento do anterior. No caso dos populares, podemos encontrar veículos custando R$ 33 mil na versão básica e R$ 75 mil na versão com todos os equipamentos. No caso dos importados, há modelos custando R$ 45 mil a mais completos. A Volkswagen alega que o nível de tecnologia é superior, mas as versões top de linha tem volumes de vendas muito baixos, comprovando que o consumidor não aceita um sobrepreço tão grande.
6. Importados competem com marcas de luxo em preço – mais um desdobramento da política de preços. No que concerne à tecnologia e motorizações disponíveis, os veículos importados como Jetta, Passat, Tiguan, Touareg e Passat CC estão em linha com o segmento de luxo, incluindo a irmã Audi, com a qual compartilha plataformas, motores e equipamentos. O ponto negativo é o preço similar. O comprador prefere levar para casa um Audi, Mercedes-Benz ou BMW, marcas com mais prestígio.
7. A tecnologia dos importados não chega à linha de entrada – os motores e tecnologia da Volkswagen estão à frente dos concorrentes, especialmente na faixa até R$ 50 mil. A questão reside no fato de ela não ser transferida para os modelos mais acessíveis, desperdiçando uma chance de se diferenciar e retomar a liderança. Resumindo: a VW possui tecnologia avançada, mas prefere manter configurações superadas nos carros de entrada, deixando a concorrência ganhar seu espaço. A aplicação dos motores TSI, econômicos e de bom rendimento, trariam vantagem competitiva se tivessem sido aplicados antes.
8. O atendimento das concessionárias não se diferencia – o cliente está mais exigente nos dias de hoje, e ter um pós-venda caprichado ajudaria a ganhar mercado. Práticas como empurrar serviços desnecessários, oficinas lotadas e infraestrutura fraca nos autorizados não atendem aos anseios nos novos consumidores.
A Volkswagen possui um nome forte, todas as características e tecnologias para voltar a ser líder, mas a demora em disponibilizá-las, a rever a política de preços e a reagir às mudanças tem feito a marca vender abaixo de seu potencial.