Colocar aerofólio e saias no carro melhora a aerodinâmica?
Muitos apaixonados por carros gostam de melhorar a aparência e performance de seu veículo. Ou pelo menos deixá-lo mais bonito. Principalmente se for um modelo popular, encontrado aos milhares nas ruas. Seu dono deseja ter um exemplar único com pouco investimento. Os proprietários de exemplares mais caros, com orçamentos de cinco dígitos, buscam aprimoramentos mais expressivos de performance e design.
Isso posto, uma das primeiras alterações a ser cogitadas consiste na instalação de body kits completos, com aerofólios, saias dianteiras, traseiras, laterais e outros apêndices aerodinâmicos. O resultado estético varia conforme o gosto do dono, como mostra a foto acima. Mas instalá-los melhora mesmo a aerodinâmica?
Precisamos avaliar caso a caso, conforme as variáveis abaixo:
Em primeiro lugar, deve ficar claro que apêndices aerodinâmicos passam a surtir efeitos apenas a partir de 120 km/h. Por esse motivo, as asas móveis dos modelos da Porsche se levantam a partir desta velocidade e ficam embutidas na carroceria abaixo dela.
Em suma, se você pretende usar seu automóvel em uso urbano e/ou dentro das velocidades permitidas nas rodovias brasileiras, o body kit possui utilidade mínima ou nula, se resumindo a um acessório estético.
Caso o veículo seja preparado para andar em pistas e/ou track days, os efeitos aerodinâmicos devem ser levados bem a sério. O tipo de desenho das peças fará grande diferença no resultado final.
Os kits aerodinâmicos buscam dois efeitos: geração de downforce (força aerodinâmica para baixo, com vistas fazer o carro “grudar no chão” e melhorar a estabilidade) e melhoria do fluxo de vento pela carroceria, ou diminuição do arrasto aerodinâmico, cujo objetivo consiste em reduzir a resistência que o ar exerce sobre o veículo.
Por outro lado, os adeptos do tuning unicamente estético costumam se esquecer da função aerodinâmica dos acessórios, os quais pioram o coeficiente de arrasto e geração de downforce ao invés de melhorá-lo com a escolha de desenhos anti-funcionais.
Nas imagens abaixo, seguem alguns exemplos de apêndices aerodinâmicos e suas implicações, comentadas detalhadamente:
AEROFÓLIOS
Este modelo, descolado da carroceria, gera downforce em altas velocidades. Porém, também aumenta o arrasto aerodinâmico devido ao tamanho grande e aumento do turbilhonamento do ar na parte de trás do teto do veículo. Apesar do bom resultado estético (para o gosto de alguns), o efeito aerodinâmico é negativo, pois o aumento da resistência ao fluxo de ar supera o ganho de pressão do vento. Este efeito se agrava em veículos de carroceria hatchback, como o desta imagem e a que segue abaixo.
Este modelo de asa traseira se mostra muito mais funcional em comparação ao anterior. A depender do desenho, pode gerar a mesma quantidade de sustentação negativa, sem gerar tanta entropia aerodinâmica por funcionar como um prolongamento do teto do veículo, mantendo o fluxo de ar uniforme. Para quem deseja melhorar a performance em pista, este é o modelo recomendado.
Para modelos de três volumes, vale o mesmo. Nos anos 80 e 90, modelos como o VW Santana e Chevrolet Vectra, muito populares até os dias de hoje, ganharam uma grande variedade de acessórios, de fábrica e paralelos, como comprovam as fotos abaixo.
Este modelo de aerofólio traseiro, exclusivo para a versão Executivo do VW Santana, possui fins estéticos, pois não gera downforce. Por outro lado, as saias laterais melhoram o fluxo de ar, apesar de não trazerem ganhos em desempenho e consumo.
Este outro modelo favorece a aerodinâmica em caso de modelos preparados para pista, pois atua para melhorar o fluxo de ar na parte traseira.
A imagem abaixo, de uma asa traseira com desenho bastante popular, não traz ganho algum, pois aumenta muito o arrasto aerodinâmico com pouca geração de sustentação negativa. Além de ser pesada, variando entre 5 e 20 quilos, a depender das dimensões e material empregado.
Deve ser aplicada apenas para fins estéticos como campeonatos de tuning, pois sua funcionalidade prejudica a aerodinâmica. Novamente, uma questão de gosto pessoal e objetivo do projeto.
Para as saias laterais, a regra consiste em buscar um desenho limpo e fluido, como foco na melhoria do fluxo de ar nas laterais do veículo. Modelos muito rebuscados e cheios de reentrâncias também aumentam o arrasto aerodinâmico.
Saias ou spoilers dianteiros podem gerar downforce, como nos monopostos de Fórmula 1, ou apenas facilitam o fluxo de ar na dianteira, assim como favorecem ou prejudicam a refrigeração do motor. Em tese, escolher um modelo mais “fechado” de saia dianteira melhora a aerodinâmica, pois grades grandes aumentam a entrada de vento no compartimento do motor, gerando turbilhonamento por dentro da carroceria e criando resistência e arrasto.
Por outro lado, deve-se ter cuidado ao reduzir a área de entrada de ar para refrigeração do motor, especialmente em modelos com motor preparado. A redução de fluxo de ar pode causar superaquecimento do conjunto mecânico, com efeitos catastróficos. No popular, fundir o motor.
Alguns pilotos amadores optam por fechá-la com fita adesiva por curto período de tempo, como se faz em categorias como a norte-americana Nascar. Assim, acabam incorrendo no mesmo risco. Portanto, deve-se ter muita cautela em um projeto de frente “mais fechada” e não ir na onda de melhorar a aerodinâmica fechando a grade com “silver tape”, pois a brincadeira pode sair bem cara.
No caso do spoiler traseiro, seu objetivo consiste em ordenar o fluxo de ar na parte traseira do assoalho do carro, de forma complementar à asa traseira, que faz o mesmo na parte superior. O modelo em voga é o extrator, à moda dos carros de Fórmula 1. Mesmo que apenas sugira o formato e tenha efeito meramente estético. Ele busca fazer o ar fluir sem turbilhonamento na parte inferior do veículo.
A imagem abaixo mostra um exemplo de componentes disponíveis no mercado, para o Chevrolet Corsa. A peça superior é o spoiler dianteiro, a do meio, spoiler traseiro e as duas no rodapé consistem nas saias laterais:
Os modelos aplicados no Honda Civic de nona geração distinguem de maneira integral alguns conjuntos funcionais de outros com foco na estética:
Este body kit se mostra bastante funcional e limpo, seguindo o padrão dos utilizados pelas fábricas em versões esportivas ou esportivadas. Repare na asa traseira integrada à tampa do porta malas e ao aspecto fluido das saias lateral e traseira.
Este outro modelo, apresentado em eventos de tuning, apresenta desenho bastante rebuscado e oferece poucos ganhos para modelos de rua, exceto aqueles com foco em competições, os quais receberam preparações radicais.
Alguns modelos, como o Mercedes Classe A, recebem placas no assoalho do veículo com foco na redução do arrasto entre o piso e o assoalho. Uma modificação mais radical consiste na instalação de uma placa plana, fechando-o todo, a exemplo de muitos modelos da Ferrari.
Como o componente agrega bastante peso ao veículo – além de ser caro – traz ganhos perceptíveis apenas em velocidades acima dos 200 km/h e para modelos muito potentes, com mais de 400 cv. Para modelos comuns, sem modificações profundas, não se mostra viável.
Outro ponto negativo reside na facilidade de se danificar as peças instaladas na parte inferior do veículo, mais próximas ao piso, ao trafegar em ruas esburacadas e irregulares.
Vale lembrar que um body kit completo aumenta o peso do veículo em 10 a 50 quilos, a depender do material e dimensões dos apêndices.
Os componentes comuns, encontrados no comércio de acessórios costumam ser fabricados do mesmo material dos para-choques do modelo e os preços se mostram acessíveis e resistentes a impactos. Por outro lado, a personalização se limita à pintura e aos modelos disponíveis no mercado, além do maior peso. A alternativa elegante são os modelos de fibra de vidro ou de carbono, importados ou fabricados sob medida. Mais leves, possuem boa estética e baixo peso. Os ônus ficam por conta do alto preço e delicadeza das peças, as quais exigem bastante cuidado ao guiar.
CONCLUSÃO
Em relação ao efeito prático, os kits aerodinâmicos exercem grande influência na performance, mas apenas em velocidades acima das permitidas em nossas vias. Aqueles que buscam preparar um modelo para competição ou alta performance devem fazer um projeto detalhado e consistente. Os reles mortais, que desejam apenas melhorar o visual do seu carro do dia-a-dia, devem ter em mente que a influência na performance do veículo é mínima e valorizar a estética. Buscando o bom gosto, claro, para o tuning não virar “xuning”.
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