Os preços dos carros no Brasil são absurdos, mas alguns são mais que outros. Veja como ser menos explorado.
Este tema consiste em objeto de discussão exaustiva, na qual todos os brasileiros concordam por unanimidade: os carros no Brasil são caros. Muito caros. Absurdamente caros. Principalmente em comparação aos modelos idênticos vendidos no primeiro mundo. Culpa-se o governo pelos altos impostos cobrados, e as montadoras pela ganância em sua margem de lucro. Ambas se mostram verdades.
Então, o consumidor que não abre mão de comprar um veículo zero quilômetro questiona: eu preciso de carro para ir e vir dos lugares e preciso comprar no Brasil, pois moro aqui. É possível não ser explorado?
Por outro lado, poucos param para refletir nas questões culturais e mercadológicas que levam aos preços elevados, especialmente em alguns modelos e categorias. Isso significa que alguns modelos possuem sobrepreço maior que outros. Às vezes, três vezes maior. Abaixo, serão detalhados alguns fatores que fazem que alguns consumidores sejam mais “esfolados” do que outros.
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Carros da moda
Alguns modelos obtêm grande visibilidade e ficam em evidência por aparecer em filmes, músicas, seriados ou novelas famosos, como foi o caso do Chevrolet Camaro amarelo, objeto de uma música sertaneja e um filme. Isso resulta em um preço em dólares três vezes maior por aqui (US$ 113 mil) em relação ao seu país de origem (US$ 32.300), além de um acréscimo de R$ 10 mil caso o feliz cliente opte pela cor amarela.
Outros exemplos de veículos que tiveram seu preço inflado por um modismo são o Ford Maverick, Chevrolet Opala e Infiniti FX35, os quais ficaram famosos por aparecer em filmes e novelas.
2. Sucessos de vendas
Modelos em evidência, com alta procura pelos consumidores, quase sempre terão sobrepreço. Algumas vezes, o fabricante subestima a aceitação do produto pelo mercado e produz ou importa quantidades inferiores á demanda, gerando ágio e longas filas de espera.
Fatores pontuais podem pressionar o valor de venda de um carro novo, como dificuldades na importação ou problemas na produção. Nestes casos, a melhor alternativa para não pagar caro demais reside na pesquisa e compra de um modelo de qualidade similar, mas menos desejado.
3. Marcas de luxo
O proprietário de um veículo de luxo busca posicionamento e status ao dirigir o modelo de sua escolha. Busca qualidade e tecnologia superiores e, principalmente, exclusividade. Por isso, o sobrepreço se mostra valorizado pelos compradores de automóveis de marcas premium, pois ressalta o caráter posicional desta categoria. Mesmo que os custos de produção sejam mais elevados devido ao maior refinamento técnico e de acabamento, os fabricantes sempre terão amplas margens de lucro neste segmento, no qual pagar mais caro se mostra parte essencial da aquisição. Em suma, carros de luxo dificilmente serão uma pechincha.
4. SUV´s e esportivos
O consumidor brasileiro considera as questões estéticas como principal fator de escolha de um modelo. SUV´s e esportivos se mostram os preferidos de enorme parcela dos motoristas. As montadoras sabem muito bem disso, e fazem questão de cobrar mais caro por essas variantes.
Um exemplo emblemático são os Honda Fit (hatch compacto) e HR-V (SUV). Ambos compartilham plataforma e conjunto mecânico. A parte “invisível” de ambos os modelos se mostram praticamente iguais, apenas a carroceria muda. E os preços.
Enquanto o Fit custa entre R$ 52 mil (DX manual) a R$ 68 mil (EXL automático), o HR-V parte de R$ 75 mil (LX manual) a R$ 94 mil (EXL automático). Nas versões mais completas, são R$ 26 mil a mais pelo mesmo carro!
Fazendo outra comparação dentro da mesma marca, a Honda, os preços do HR-V ficam no mesmo patamar de seu irmão Civic. Mas este é um sedan médio, de categoria superior, com motor bem mais potente, projeto mais sofisticado e de porte maior. Em resumo, o consumidor paga o preço de um sedan médio por um SUV compacto.
Ainda falando de Honda, o Civic também tem um irmão SUV compartilhando sua mecânica e plataforma: o CR-V. Enquanto o sedan mais completo sai por R$ 92 mil, sua variante fora-de-estrada pode ultrapassar os R$ 150 mil. Será que vale a pena pagar tão caro por uma preferência?
5. Algumas marcas cobram mais do que outras
O sonho de todo fabricante é ter uma marca forte, pois sabe que ela possibilita aumentar a margem de lucro sem aumento de custos. Para isso, pesados investimentos em marketing costumam ser feitos pelas montadoras.
Honda e Toyota seguem essa prática com sucesso e obtêm grandes resultados com isso, como mostram os exemplos abaixo.
No primeiro caso, compara-se os preços de Chevrolet Cruze LT automático e Honda Fit EX, também automático, nos mercados brasileiro e americano, nos quais ambos são comercializados em suas respectivas versões.
Vale ressaltar que o Fit EX consiste na versão mais completa de um modelo hatch compacto, e o Cruze LT na intermediária de um sedã médio. Escolhi estes modelos e versões por apresentarem preços semelhantes no Brasil e muito diferentes nos EUA.
Por aqui, ambos eram oferecidos por R$ 67.800 em novembro de 2015. Na terra do Tio Sam, o Chevrolet Cruze LT automático custava US$ 23.370 (R$ 92.077) enquanto o Honda Fit EX saía por US$ 18.500 (R$ 72.890).
Posto isso, chega-se a duas conclusões:
1- O consumidor brasileiro paga R$ 20 mil a mais que seu equivalente americano para levar um Honda Fit para casa. A causa reside na força da marca no Brasil, a qual não encontra eco nos EUA para que o consumidor de lá aceite pagar tal sobrepreço.
2- Considerando a cotação do dólar utilizada para fazer os cálculos, R$ 3,94, de 30/11/2015, o consumidor brasileiro paga 35% a menos pelo Chevrolet Cruze que o norte-americano, enquanto o desconto para o Honda Fit é de apenas 7,5%. Caso a cotação do dólar fosse de R$ 2,20, como em 2014, o Chevrolet sairia por R$ 51.414, o que faria o brasileiro pagar 32% a mais que seu colega americano, enquanto o Honda custaria R$ 37 mil, resultando em um sobrepreço de 83%.
Assim, conclui-se que a Honda tem margem de lucro três vezes maior em seu compacto que a Chevrolet em seu sedã médio. A Honda explora mais seu cliente que a Chevrolet.
O segundo exemplo consiste na comparação de preços dos três sedãs mais vendidos do Brasil, Honda Civic, Toyota Corolla e Chevrolet Cruze, com os modelos vendidos nos EUA em versões equivalentes. Nas cotações feitas em concessionárias locais, há grande discrepância em relação aos preços praticados na terra de Tio Sam, como relatado abaixo.
Honda Civic LXR automático
Melhor preço no Brasil: R$ 76 mil. Preço nos EUA: US$ 21.090 (R$ 83.094). O Civic brasileiro é 9,3% mais barato que o americano.
Toyota Corolla XEi automático
Melhor preço no Brasil: R$ 82.500. Preço nos EUA: US$ 19.765 (R$ 77.874). Mesmo com o dólar a R$ 3,94, o Corolla americano é 6% mais barato em relação ao brasileiro.
Chevrolet Cruze LT automático
Melhor preço no Brasil: R$ 67.800. Preço nos EUA: US$ 23.370 (R$ 92.077). O brasileiro para 35,8% a menos pelo Cruze que o consumidor americano. De longe a maior diferença.
Para explicitar ainda mais a discrepância entre os preços praticados pelas marcas no Brasil e nos EUA, vamos considerar a cotação do dólar em maio de 2014, de R$ 2,20. Abaixo, segue a comparação de preços em reais, e suas respectivas diferenças entre os mercados.
Honda Civic: Brasil: R$ 76 mil. EUA: R$ 46,4 mil. Os brasileiros pagariam 64% de ágio em relação aos americanos.
Toyota Corolla: Brasil: R$ 82.500. EUA: R$ 43,5 mil. Os brasileiros pagariam 89% mais caro que os americanos, quase o dobro de ágio.
Chevrolet Cruze: Brasil: R$ 67.800. EUA: R$ 51,4 mil. Por esse modelo, os brasileiros pagam ágio de 32%, metade do pago pelo Honda e um terço do exigido pela Toyota.
Após esta longa análise, a pergunta que não quer calar é a seguinte: Por que os brasileiros aceitam pagar muito mais caro por carros da Honda e da Toyota? E por que os americanos não aceitam? Será que é inteligente pagar este sobrepreço para ter um carro destas marcas, mesmo com seus diferenciais?
MAIS VALOR POR MENOR PREÇO
A realidade das vendas também diverge nos dois países: por aqui, a dupla japonesa domina dois terços das vendas, enquanto o Chevrolet ocupa posição coadjuvante mesmo com a diferença de preços. Por lá, o sedã da marca da gravata dourada luta pela liderança, enquanto seus rivais japoneses ficam nas posições intermediárias do ranking de vendas de seu segmento, altamente disputado e com constante troca de líderes.
Todos estamos carecas de saber que o preço dos carros no Brasil é o mais alto do mundo, mas se prestarmos atenção a estes fatores citados neste texto, poderemos ser menos explorados pelos fabricantes e pelo governo. Ou faremos maus negócios de forma consciente, na pior das hipóteses.
Preço é o que você paga, valor é o que você leva para casa.
Nota: As cotações dos modelos brasileiros foram feitas em concessionárias no período de 01/11/2015 a 28/11/2015 pelo autor do blog. Os preços dos modelos americanos foram retirados dos sites oficiais das marcas http://www.chevrolet.com e http://www.honda.com.
Que ótima sua página! Pena que demorei a descobrir!
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