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Os carros elétricos são mesmo ecologicamente corretos?

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Desde o início da década, temos sido bombardeados com a informação de que carros elétricos são modelos de “emissão zero”, “ecologicamente corretos”, “possuem impacto ambiental muito menor do que um a combustível fóssil”, “são a salvação do meio ambiente contra a energia suja” e uma infinidade de chavões e clichês sobre serem “amigos da natureza”.

Nos países desenvolvidos, em especial EUA e Europa, a questão ambiental recebe maior destaque no debate sobre as tecnologias de veículos movidos a eletricidade, posto que  não há grande diferença de preços em relação a modelos com motores de combustão interna.

No Brasil,  nação menos preocupada com assuntos ecológicos, eles se tornarão um grande sucesso devido a uma solução de natureza mais prática: economia financeira com combustível e impostos.

Outro trunfo desta motorização reside nos menores custos de manutenção, em relação a um equivalente movido a combustão interna. A despesa com eletricidade gira em torno de um quarto do valor desembolsado em combustíveis líquidos para motores do ciclo Otto ou Diesel, favorecendo a escolha destes modelos.

Por ora, as vendas são irrisórias por aqui devido ao alto custo de aquisição. O modelo mais acessível, o Toyota Prius, não sai por menos de R$ 125 mil. Os consumidores torcem para que sua aceitação aumente conforme os preços se reduzam, a partir de novembro, com o início do novo regime automotivo, denominado Rota 2030.

Híbridos e elétricos virarão a próxima febre da indústria automobilística. Mas será que eles são mesmo menos agressivos ao meio ambiente, como pregam os fabricantes, os ativistas e os estudiosos do tema?

IMPACTO AMBIENTAL TOTAL

Analisando de maneira superficial, tende-se a acreditar que veículos híbridos e elétricos poluem menos devido ao menor uso de combustíveis e, consequentemente, menores emissões de gases poluentes durante sua operação, especialmente nos grandes centros urbanos.

A redução nas emissões de gás carbônico se mostram um benefício incontestável. Porém, uma análise mais abrangente se mostra obrigatória para descobrir se veículos elétricos têm menor impacto ambiental de fato. Ou se o que sabemos se trata apenas de propaganda enganosa.

Aferir todo o impacto de sua fabricação, operação e descarte, incluindo as emissões de poluentes, a extração das matérias-primas, processos de manufatura, uso de combustíveis fósseis, impactos para a produção de energia elétrica, manutenção e reparação e até o descarte, aferindo todo o ciclo de vida útil do produto.

Apenas desta forma pode-se descobrir se os modelos “a bateria” são mesmo ecologicamente corretos, como alardeiam seus defensores. Este é o tema dos próximos 5 tópicos.

1 – O IMPACTO AMBIENTAL DA FABRICAÇÃO E DESCARTE DE MODELOS “A BATERIA”

Uma verdadeira análise sobre a pegada ambiental de veículos movidos a eletricidade não considera apenas as emissões de poluentes geradas pela sua circulação.

Deve-se considerar todo o ciclo de vida: extração das matérias-primas, fabricação, operação, manutenção, produção dos combustíveis e descarte. Todos os recursos naturais usados devem ser considerados.

O calcanhar-de-aquiles dos modelos híbridos e elétricos são as baterias. Atualmente, o material predominante em sua fabricação é o lítio. A parte elétrica desses modelos também utiliza maior quantidade de cobre em relação aos modelos convencionais.

Para os modelos plug-in, aqueles que podem ser carregados em tomadas na rede elétrica (como os smartphones), deve-se considerar o impacto ambiental da produção de energia elétrica e a matriz do país onde circulam.

A redução do uso de gasolina e diesel implica sua substituição por outra fonte de energia: carvão, gás natural, diesel, urânio, vento, luz solar ou quedas d´água. Todos os detalhes devem ser considerados.

2 – A PRODUÇÃO DE BATERIAS DE LÍTIO NÃO É NADA ECOLÓGICA

carros elétricos não são ecológicos

Minas de cobre e lítio causam enorme impacto ambiental.

Veículos híbridos ou elétricos utilizam menor quantidade de combustíveis fósseis para sua propulsão – talvez não os utilizem totalmente. Todavia, a produção das baterias  e sistema elétrico, depende da mineração de cobre e lítio.

Estes metais são extraídos do meio ambiente nas atividades de mineração, a qual impõe pesado impactos ambientais. Desmatamento, contaminação do solo com materiais tóxicos, desertificação de áreas, danos à fauna e flora, condições de trabalho insalubres e/ou perigosas, consumo de grandes quantidade de combustíveis fósseis, construção de barragens, mudança no curso de rios, dentre tantos impactos possíveis.

Em sua fabricação, os materiais são submetidos a diversos processos químicos, os quais geram diversos resíduos a ser descartados e/ou tratados, gerando novo impacto ambiental.

Em resumo: veículos elétricos consomem quantidades cavalares de cobre e lítio, obtidos com mineração, uma atividade com grandes impactos ambientais. Boa parte da redução nas emissões de gases tóxicos são anuladas pela construção das baterias.

3 – O DESCARTE DAS BATERIAS SE TORNARÁ UM PROBLEMA NA PRÓXIMA DÉCADA

Da mesma maneira que a produção das baterias aumenta a pegada ambiental dos modelos com esta motorização, seu descarte tende a se tornar um grave problema se não tratado corretamente.

Grande parte dos materiais já passam por processos de reciclagem, também com o uso de produtos químicos e descarte de materiais tóxicos, mesmo que em menor escala.

Via de regra, as baterias de modelos híbridos e elétricos duram de 8 a 10 anos. As vendas destes veículos cresceu exponencialmente nesta década e sua participação no total seguirá crescendo.

Isto significa que a falta de planejamento pode gerar questões ambientais sérias se não houver melhorias nas tecnologias de produção, reciclagem e descarte dos materiais dos sistemas de propulsão híbrida ou elétrica. A contribuição dos modelos “a bateria” para a melhoria ambiental passa por esta questão, a qual não influencia os modelos tradicionais.

4- CARROS ELÉTRICOS SÃO MOVIDOS A CARVÃO

Modelos híbridos sem a opção plug-in precisam de gasolina para rodar, mesmo que em menor quantidade. Mas de onde vem a energia elétrica que os move?

A tecnologia que nos permite abastecê-los com a eletricidade da rede elétrica nos obriga a descobrir a fonte de geração da energia. Em países como Estados Unidos e Alemanha, as usinas a carvão, gás natural e óleo combustível dominam a matriz energética. Japão e França optaram pelos reatores nucleares.

No Brasil, a fonte de energia elétrica predominante consiste na hidrelétrica. Apesar de emitir pouquíssimos gases estufa, sua construção e operação gera enorme impacto no ecossistema local.

No somatório, mais de 95% da energia elétrica produzida no mundo advém das matrizes termoelétrica, hidrelétrica e nuclear. As chamadas fontes alternativas, tais como a eólica e solar, representam uma parcela ínfima no total. Além de sua geração se mostrar financeiramente desvantajosa para ser produzida em grande escala.

IMPACTOS DAS USINAS TERMOELÉTRICAS

carros elétricos são movidos a carvão

Os dois primeiros têm sua “correção ecológica” anulada o impacto da poluição atmosférica das usinas. Ou seja, os poluentes despejados na atmosfera pelos escapamentos são transferidos para as chaminés das plantas termoelétricas, resultando em pequenas reduções nas emissões totais.

Abastecer as baterias dos veículos movidos a eletricidade com energia produzida por usinas termoelétricas apenas transfere as emissões de poluentes das cidades para as plantas.

Deve-se ter em mente que a produção e descarte das baterias gera grande impacto ambiental, o qual demanda cerca de 150 mil quilômetros rodados para obter o brakeven (ponto de equilíbrio) e tornar os modelos elétricos mais “verdes” em relação aos tradicionais.

USINAS NUCLEARES

Muito se sabe sobre os danos potenciais de vazamentos em reatores nucleares. Chernobyl e Fukushima deram grandes lições sobre os perigos do urânio. O descarte do lixo nuclear ao final da vida útil preocupa os ambientalistas e gestores das plantas.

Vale a pena trocar o uso de gasolina e diesel pela construção de dezenas de usinas nucleares, somente para fornecer energia aos carros elétricos e reduzir as emissões de gás carbônico dos motores de combustão? A resposta é clara.

USINAS HIDRELÉTRICAS

No Brasil, a fonte hidrelétrica domina nossa matriz. Sua construção causa a desapropriação de aldeias indígenas, grande impacto na fauna e flora e a inundação de áreas enormes para a construção de hidrelétricas. Por sua vez, uma planta gera grande quantidade de energia barata e com baixíssima emissão de poluentes.

O QUE ACONTECERIA NO BRASIL?

Entretanto, a construção de uma usina hidrelétrica leva muitos anos. Atualmente, o sistema elétrico brasileiro opera próximo à sua capacidade total. Para emergências, os operadores do sistema mantêm algumas termoelétricas como backup, as quais operam na ausência das fontes principais. Quando necessário, o Brasil pode comprar energia excedentes de países vizinhos, mais notadamente do Paraguai e sua parcela da Itaipu.

Um aumento súbito na demanda por carros elétricos, e consequentemente na eletricidade, obrigaria os gestores a deixar as termoelétricas em operação permanente e adquirir a energia excedente dos vizinhos, aumentando a poluição atmosférica e o custo da energia.

5 – O IMPACTO AMBIENTAL DAS ENERGIAS “ALTERNATIVAS”

Muito se fala sobre as energias alternativas  como painéis solares e geração eólica, tratando-as como “limpas”. Seriam elas uma possível solução para a poluição gerada pelas usinas termoelétricas e/ou nucleares?

A resposta é não. Painéis solares afetam o clima local e, a exemplo das baterias, sua produção, descarte e reciclagem também geram impactos e consomem energia.

Os parques eólicos também possuem sua pegada ambiental. Sua produção exige siderurgia intensiva, atividade industrial que consome muito carvão e gera grande quantidade de gases poluentes. Outro revés consiste no ruído gerado pelas turbinas em sua operação.

Ao totalizar todos os prós e contras da energia alternativa, há uma desvantagem que pesa bastante: a intermitência na geração de energia. Painéis solares produzem pouca energia em períodos de baixa incidência de luz, ao passo que turbinas eólicas dependem das correntes de vento, com grandes períodos sem geração alguma.

A Alemanha investe pesado em fontes alternativas de energia há décadas. Mesmo liderando a produção de energias eólica e solar, as fontes tradicionais representam mais de 90% da produção total. No inverno, elas se aproximam dos 100%.

Na ausência da energia alternativa, as fontes tradicionais assumem o papel de abastecer os veículos elétricos. Ao totalizar a conta, conclui-se que os carros elétricos são movidos a carvão, óleo combustível, gás natural, urânio e grandes barragens.

POR QUE NÃO O (BOM E VELHO) ETANOL?

Atualmente, a matriz energética brasileira é uma das mais limpas do mundo. O uso intensivo do etanol contribui muito para a redução das emissões de combustíveis fósseis, posto que este entrega resultado muito semelhante ao dos derivados de petróleo.

Um fator interessante da produção de etanol, derivado da cana-de-açúcar, consiste na absorção de gás carbônico da atmosfera por meio da fotossíntese, anulando a maior parte do impacto gerado pelas emissões dos motores veiculares.

No uso do etanol, ocorre o fenômeno contrário ao dos modelos elétricos: motores a álcool emitem quantidade de poluentes pouco menor que os similares a gasolina, no qual o gás carbônico expelido nas cidades é retirado pelos canaviais, nos quais se cultiva a cana-de-açúcar.

QUAL A ALTERNATIVA MAIS ECOLÓGICA?

No Brasil, o veículo ideal para minimizar os danos ao meio ambiente seria um híbrido, cujo motor a combustão movido a etanol funcionasse em conjunto com um sistema elétrico, de modo a otimizar os impactos dos gases estufa com os da fabricação e descarte de baterias.

Por enquanto, os veículos mais ecológico disponível por aqui são os movidos a etanol com melhor eficiência energética, com etiquetagem “A” do Inmetro e/ou com média de consumo superior a 10 km/l na cidade e 13 km/l na rodovia, ao funcionar com o combustível vegetal.

No restante do mundo, no qual os biocombustíveis não se mostram viáveis e/ou os fabricantes locais não se interessam pelo seu uso, o automóvel mais ecologicamente eficiente são os modelos a gasolina com médias de consumo superiores a 20 km/l, cujas emissões totais ficam abaixo de 100 gramas de gás carbônico por quilômetro rodado.

Os modelos híbridos mais atuais emitem menos de 70 gCO²/km, mas o uso de baterias anula boa parte da redução nas emissões de gases poluentes. O vídeo abaixo mostra um comparativo entre a pegada ecológica de um modelo elétrico e outro tradicional.

VÍDEO COMPLEMENTAR

Este vídeo, do canal Prager University, no YouTube, aborda a questão do verdadeiro impacto dos modelos elétricos em países desenvolvidos.

ENTÃO NÃO DEVEMOS INVESTIR EM ELÉTRICOS?

Claro que sim. Uma combinação de modelos elétricos com outros movidos a etanol pode trazer grandes benefícios para a matriz energética brasileira, assim como reduzir a poluição gerada pelos combustíveis fósseis.

No que concerne a questões ecológicas, a diversificação  de fontes de energia reduz o impacto total e possibilita o desenvolvimento tecnológico. O meio ambiente responde de forma não linear, de modo que a concentração em uma só fonte gera prejuízos maiores em relação a dezenas de pequenos impactos.

De modo ideal, buscar o balanceamento entre o uso de motores movidos a combustíveis fósseis e vegetais, em conjunto com as alternativas elétricas. O avanço tecnológico tende a equilibrar a situação em favor dos híbridos e elétricos.

OS VEÍCULOS COM MOTOR A COMBUSTÃO VÃO ACABAR?

Não. Nas próximas décadas, a maior fatia do crescimento da indústria automobilística terá origem em países emergentes. China, sudeste asiático, América Latina, África e Oriente Médio concentrarão os investimentos daqui em diante.

Nestes mercados, existe muito espaço para veículos mais acessíveis e de tecnologia mais simples. Trocando em miúdos, os motores a combustão interna experimentarão forte crescimento em veículos para países em desenvolvimento.

Os engenheiros de pesquisa e desenvolvimento já perceberam que motores a gasolina de alta eficiência energética poder ser boas alternativas aos elétricos em modelos compactos e de baixo custo, como os oferecidos na Europa. Isso significa a sobrevivência destes propulsores.

CONCLUSÃO

A ascensão dos veículos híbridos e elétricos consiste em mais uma boa opção ao consumidor. Eles possuem muitas qualidades, além da economia de combustível: seu rodar é silencioso, são muito confortáveis, são recheados de tecnologia embarcada, sua manutenção é mais simples e são duráveis e muito confiáveis.

Carros, motocicletas, ônibus e caminhões movidos a eletricidade de tornarão mais comuns e serão muito desejados em pouco tempo. Só não podemos acreditar no mito de serem “verdes” e “amigos do meio ambiente”.

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1 Comentário »

  1. FANTÁSTICO!!! Estudo muito a questão dos elétricos e concordo COM TUDO! A solução são veiculos hibridos, preferencialmente etanol & eletricos, por todas as questões levantadas… até o corona virus pode ter sido gerado pela problematica ambiental, animais e insetos fugindo do ecossistema e modificando alimentacao, a natureza é pra ser respeitada… Gostei do que falou “, o qual demanda cerca de 150 mil quilômetros rodados para obter o brakeven (ponto de equilíbrio) e tornar os modelos elétricos mais “verdes” em relação aos tradicionais. É O MELHOR ARTIGO SOBRE CARROS ELETRICOS QUE LI ATE HJ!!!

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  2. Sou exímio apaixonado por roncos de motores a combustão, acho interessante os projetos para redução de poluição do ar, mas acredito que o carro elétrico é apenas um invento a ser admirado por ser diferente,e não eficiente quanto os carros com motores a combustão.

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  3. Gostei, suas matérias exibem muito conhecimento, de forma acessível e atraente.Estou lendo em setembro 2021 e a impressão que tenho, é que o extraordinário avanço das energias renováveis desde a publicação desse seu artigo, fez com que ele envelhecesse.

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  4. mesmo após 5 anos, esta matéria é atual e informativa. Até hoje permanecemos na dependência dos combustíveis fósseis. Mas vemos movimentos tímidos de estímulo de governos e empresas para o avanço na busca plena de energia limpa e menos agressiva ao meio ambiente. Precisamos alterar esses modelos o mais rápido possível, para o benefício de todo o planeta e da vida nele presente.

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